31.1.09

Se funciona, é o que importa

Belo debate entre parceiros. Nassim Nicholas Taleb e Daniel Kahneman são entrevistados por John Brockman, editor do Edge, e dão um show de inteligência (veja o vídeo aqui).

Me chamou a atenção a fala de Kahneman sobre o uso de modelos. Para ele, nós humanos adotamos esta ou aquela teoria não por sua verdade objetiva, mas pelos seus efeitos práticos. Se funciona, mesmo que temporariamente, é o que nos importa.

A posição de Kahneman é muito semelhante àquela de Paul Feyerabend, a qual citei aqui, e lembra também as teses pragmatistas de Richard Rorty, que, por sua vez, costuma levar a idéia às últimas consequências ao afirmar que toda crença útil é verdadeira (leia aqui um pouco mais a respeito).

29.1.09

Cultura e conhecimento

Na nota anterior, citei o conceito de cultura de modo bastante superficial, sem maiores elaborações. Sugeri apenas que se tratava do conjunto de normas que observamos enquanto interagimos uns com os outros em sociedade. O termo, porém, envolve muitas outras sutilezas. Sua exata definição ainda é bastante disputada. [Continue lendo].

27.1.09

Emoções, cultura e modos de pensar

As nossas emoções não apenas carregam conhecimento como também são importantes elementos num sistema específico de pensamento, o sistema experiencial. O termo foi criado pelos psicólogos Daniel Kahneman e Amos Tversky. Segundo eles, nossas atividades mentais estão ligadas a um modo duplo de pensamento, que inclui dois sistemas: o experiencial e o cogitativo. Nesta nota, discutirei algumas das relações entre esses modos de pensar, as emoções e a cultura. [Leia o texto completo].

20.1.09

O anything goes de Paul Feyerabend e o valor dos mapas mentais

Como de costume, o Roger Oleniski postou outro texto esclarecedor. Desta vez sobre Paul Feyerabend e a ciência como forma de vida. Este trecho, sobre o sentido do anything goes do filósofo austríaco, resume bem a idéia:
"Qualquer teoria, por mais absurda e sem apoio empírico que seja, pode se tornar relevante, pois pode, quem sabe, romper com hábitos metodológicos e mentais e com o engessamento de certas regras de um jogo determinado."
A tese me fez pensar nas teorias como mapas mentais e em como, para Karl Weick, tais mapas são sempre úteis, até mesmo quando estão errados, porque sem eles não haveria aprendizado:
"Com o mapa na mão, não importa o quanto ele seja grosseiro, as pessoas codificam aquilo que vêem para que corresponda o máximo possível ao que está no mapa. Este prefixa as percepções dela, que vêem aquilo que esperam ver. Porém, à medida que se acumulam as discrepâncias, elas prestam mais atenção ao que está em sua experiência imediata, procuram padrões e prestam menos atenção ao mapa. Este torna-se então mais metafórico mas, ironicamente, somente porque foi o meio pelo qual outros mapas, mais atuais, foram formados" (p. 5).
WEICK, K. E. Cartographic Myhs in Organizations.
Em A. S. Huff, ed., Mapping Strategic Thought.
New York: Wiley, 1990: 1-10.

> Leia também: Os limites do conhecimento e como lidar com eles.

17.1.09

Conhecimento e beleza

Nem utilidade nem objetividade. I. F. Stone, autor do soberbo O Julgamento de Sócrates, sugere que a justificação necessária para as nossas crenças mais elementares é o sentimento de beleza que elas nos provocam.
"Creio que a vida do homem se reduz, em última análise, a uma fé - cujos fundamentos estão além de qualquer prova - e que esta fé é uma questão estética, um sentimento de beleza e de harmonia".
O texto é do último número do I. F. Stone's Weekly, uma newsletter bi-mensal escrita pelo jornalista entre 1953 a 1971. A publicação chegou a distribuir 74 mil exemplares numa única edição. Sua assinatura custava 5 dólares. Apesar de impresso, o periódico talvez tenha sido, em sua abordagem e propósitos, o primeiro blog jornalístico realmente independente.

Uma boa descrição da vida e dos métodos de trabalho de I. F. Stone pode ser lida na apresentação que  Sérgio Augusto fez para o livro O Julgamento de Sócrates, impecável peça de jornalismo investigativo a serviço das ciências humanas. A obra foi publicado no Brasil em 2005 pela Companhia das Letras. É imperdível.

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Veja também:

14.1.09

Sobre a dimensão social da arte

A artista visual e poeta Constança Lucas citou hoje em seu blog uma passagem interessantíssima do livro Cartas sobre Cézzane, de Rainer Maria Rilke.

É o tipo de assunto que me inquieta. Não estou tão certo assim a respeito da autonomia do fazer artístico.

A tensão entre o indivíduo e a sociedade permanece na medida em que o artista, para se expressar, lança mão de estruturas de significados compartilhadas, o que quer dizer socialmente construídas (nem que seja por meia dúzia de adeptos desta ou daquela corrente artística).

O drama é ainda maior para quem está na indústria cultural e joga com a audiência, situação em que a liberdade de expressão artística fica sujeita a uma regulação social mais evidente.

Neste caso, é preciso negociar a criatura artística, desde a sua concepção - e geralmente de modo tácito - junto ao público (por exemplo, as pesquisas de opinião sobre desfechos de filmes), aos produtores, aos gatekeepers, aos patrocinadores, aos agentes do governo, etc., o que acaba fazendo da coisa mais uma invenção coletiva do que uma expressão da singularidade do artista.

A propósito, sugiro a leitura do ensaio A arte como um sistema cultural publicado por Clifford Geertz em seu livro O Saber Local. É mais lenha na fogueira.

12.1.09

As emoções como estados mentais de representação

Por mais limitados e especulativos que sejam os nossos mapas mentais, eles são bastante complexos e cheios de sutilezas. Num post anterior, me referi a eles como 'representações da realidade em termos de categorias conceituais'. Mas não é só isso. Nossos mapas mentais também incluem outros estados psicológicos de representação, alguns dos quais envolvem as emoções.

O medo, a raiva, a paixão, etc., são informativos; as emoções carregam conhecimento. O medo de que o motoqueiro ao lado seja um assaltante, por exemplo, é um medo de que o mundo seja de um determinado modo - de um modo tal que haja muitos assaltantes usando motocicletas para abordar motoristas de automóveis.

Ao afirmar que há conhecimento embutido nas emoções, não quero dizer que tal conhecimento seja verdadeiro. Se ele corresponde ou não à realidade objetiva das coisas (isso existe?) é uma outra questão.

Preocupa-me, no entanto, que muitos de nós costumemos ignorar as nossas emoções como possíveis fontes de informação e aprendizado. No mínimo, ao refletir sobre elas, poderíamos eventualmente descobrir que se baseiam em suposições falsas ou muito pouco prováveis.

8.1.09

Quem quer saber se a verdade é verdadeira?

Outro dia escrevi sobre o fundo Madoff para ilustrar a importância da epistemologia para a gestão estratégica. Em tese, os executivos, como a maioria de nós, deveriam estar muito preocupados em tomar decisões baseadas em crenças verdadeiras:

"Por atribuir valor ao reconhecimento de meios eficazes para a realização dos objetivos, a maioria das pessoas se preocupa em apreender a distinção entre o reconhecimento verdadeiro desses meios e o reconhecimento meramente aparente. Em decorrência disso, devemos atribuir valor à epistemologia pelo menos na medida em que ela lança luz sobre a distinção entre o conhecimento verdadeiro (ou o reconhecimento) e o conhecimento aparente" (p. 44).

Moser, Mulder e Trout, em
A Teoria do Conhecimento.

Na prática, entretanto, a tese é bastante problemática: será que as pessoas realmente se preocupam em apreender a diferença entre conhecimento verdadeiro e conhecimento aparente? Ou elas preferem descobrir o conhecimento-que-funciona pelo método da tentativa e erro?

Richard Rorty, após considerar sem proveito as nossas tentativas de definir a verdade objetiva das coisas, sugere, nietzscheanamente, que toda crença útil é verdadeira.

Apesar de não responder como podemos saber se uma crença é REALMENTE útil, a proposta pragmatista me parece empiricamente válida. Percebo que, no dia a dia, raras são as vezes em que as pessoas avaliam exaustivamente se conhecem ou não a verdade objetiva das coisas.

Como sugeri aqui, geralmente tomamos como certas aquelas crenças que parecem funcionar - até que não mais funcionem. É o que propõe também Henry Mintzberg em a sua teoria sobre aprendizado estratégico.

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Nem utilidade nem objetividade. I. F. Stone sugere que a justificação necessária para as nossas crenças mais elementares é o sentimento de beleza que elas nos proporcionam.

6.1.09

Subjetividade e realidade em "Nove Noites"

"É preciso entender que cada um verá coisas que ninguém mais poderá ver. E que nelas residem suas razões. Cada um verá as suas miragens." (p. 42).

CARVALHO, Bernardo. Nove Noites.
São Paulo: Companhia das Letras, 2006.