8.5.20

Partidas e Chegadas


Passar uma temporada morando em meio à natureza enquanto a quarentena não passa.

A ideia já lhe ocorreu nestes dias?

Cada vez mais gente parece estar pensando na possibilidade - ficar preso em casa numa grande cidade em meio a um lockdown pode ser assustador.

Em outro post sobre a #culturaemmovimento, vimos como a busca por casas de sítio bate recordes no Brasil agora. Some a isso o seguinte.

Nos últimos 30 dias, as pesquisas por cabanas, barracas de acampamento e pousadas estão em alta.

Obviamente, há oportunidades para o setor de hospitalidade nas regiões mais procuradas.

Mas há desafios também. A instalação das pessoas que chegam envolve algumas demandas específicas como, por exemplo, um bom acesso à internet para que elas possam continuar trabalhando, estudando e fazendo negócios à distância.

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4.5.20

A Casa e o Trabalho


O home office está se tornando uma arena socio-ideológica barulhenta.

Por um lado, a cultura corporativa celebra o novo esquema não apenas como uma saída de emergência, mas como o novo normal, e com ganhos: os primeiros números indicam aumento considerável de produtividade.

Outras vozes sociais, no entanto, veem problemas e se inquietam.

Mulheres têm dificuldades, mais especificamente aquelas que têm filhos e assumem maiores obrigações domésticas neste momento.

Por exemplo, editores de revistas científicas detectaram que elas estão submetendo menos artigos desde o início da pandemia.

A migração para o home office tem seu lado negro.

Muitos profissionais relatam que agora o trabalho não para, com calls e videoconferências o tempo todo, desde que acordam até muito tarde da noite, quando vão dormir mais exaustos do que nunca.

Pesquisa do DigiLabour com trabalhadores de São Paulo concluiu que os setores de comunicação e de educação são o mais afetados, assim como os mais jovens, que, muitas vezes, acumulam tarefas da faculdade também.

De qualquer modo, a luta de todos agora é pela manutenção do emprego e da renda, seja a que custo for.

No Google, as pessoas procuram cada vez mais recursos para se adaptar ao novo esquema, com pesquisas crescentes sobre cadeiras e outros equipamentos para o escritório doméstico.

Busca-se muito também por dicas e orientações para a organização do teletrabalho.

Ofertas de trabalho à distância é outro assunto em alta. As pessoas vão à luta na busca por emprego.

Enquanto isso, as pesquisas relacionadas a direitos e leis trabalhistas estão em baixa.A crise parece obrigar a gente a aceitar qualquer condição, contanto que haja chance de sobreviver e, com um pouco de sorte, manter o padrão de vida.

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3.5.20

A Democriacia e o Capitalismo


Capitalismo não rima com democracia.

É o que sugerem as palavras mais usadas pelos brasileiros quando pesquisam pelo assunto na internet.

Nenhuma delas refere-se a democracia.O que eles têm em mente quando buscam informações sobre capitalismo?

Uma análise das palavras que estão em ascensão sugerem novos interesses: o "fortalecimento do capitalismo", "capitalismo reverso", os "símbolos do capitalismo", suas "fases" e modalidades.

Curiosamente, democracia é um termo cada vez mais lembrado quando as pessoas pesquisam a respeito de socialismo.

Nessas buscas, democracia é relacionada a socialismo especialmente quando elas buscam saber sobre "o que é democracia" e sobre "socialismo democrático.

O divórcio entre democracia e capitalismo tem sido enfatizado por vários pensadores atualmente, entre eles Agamben, Chomsky e Han Byung-chul.

Porém, lembremo-nos: quando e onde esses dois regimes chegaram a ter um casamento sólido?

Na Europa, a associação entre capitalismo e autoritarismo foi notável nos casos do nazismo e do fascismo, que acabaram vencidos por forças democráticas.

Atualmente, no entanto, vemos avançar naquele continente uma série de governos de tendência totalitária, e isto acontece em plena ordem capitalista.

No terceiro mundo, houve durante a guerra fria várias ditaduras patrocinadas pelos EUA, baluarte do capitalismo, que estavam preocupados com a expansão do comunismo liderado pela União Soviética.

No Brasil de hoje, o espantalho do comunismo saiu do armário como peça de propaganda do presidente Bolsonaro e de seus aliados, que chegam a falar na volta do AI-5 para evitar um golpe de estado que estaria sendo organizado por "comunistas".

Talvez por isso, pela primeira vez nos últimos 5 anos, o termo comunismo passou a ser mais procurado do que socialismo e, por quase 3 semanas entre março e abril, mais do que democracia.O fenômeno acontece em meio à radicalização política crescente.

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1.5.20

A Capital e o Interior


A busca por "casas de sítio" está experimentando no Google o mais alto pico em 5 anos.

O fenômeno ocorre fora da temporada de férias, período em que a procura por esses imóveis costuma aumentar.

A tendência coincide com o crescimento do teletrabalho, que deve se consolidar em um novo patamar.

Estudo da FGV indica que o home office crescerá 30% mesmo com a retomada das atividades.

Assistiremos a uma revalorização do interior como local de moradia por parte daqueles que hoje se sentem ameaçados pelas aglomerações em grandes cidades?

São esses indivíduos que sofrem também as maiores restrições em sua liberdade de ir e vir neste momento.

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30.4.20

O Influente e o Popular


Embora não seja tão popular quanto o Instagram ou o Facebook, o TikTok tem se tornado culturalmente influente em nosso país.

Será que ele se tornará mainstream por aqui algum dia, com uma audiência tão grande como a das maiores redes?

Ou ocupará uma posição similar a do Twitter, uma rede de nicho, mas influente, um verdadeiro laboratório de novas narrativas e linguagens que depois se espalham por outras redes?

Por enquanto, é isto o que temos visto, com tiktokers compartilhando seu conteúdo no Instagram, no Facebook e no próprio Twitter.

A título de curiosidade, lembremo-nos de algumas redes cuja audiência nunca explodiu no Brasil, mas que lançaram formatos novos e estéticas peculiares.

O Snapchat criou o que hoje conhecemos por stories, que fazem muito sucesso no Instagram.

O Tumblr em certo momento era muito citado por usuárias de outras redes, as quais nunca tiveram um perfil por lá, mas escreviam no Facebook e no Instagram: "toda tumblr".

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28.4.20

O Local e a Nação


No interior, a política local é naturalmente um lugar do encontro.

Não há como evitar os vizinhos desse condomínio que é a pequena cidade, ou vê-los apenas de longe, passeando no feed de uma rede social qualquer.

É preciso organizar o espaço comum, dividir a calçada, a cortesia nas festas da comunidade e até o ar que se respira nos poucos consultórios do lugar.

Obviamente, há sempre paranoicos percorrendo os quarteirões. Mas eles tendem a ser marginalizados e esquecidos pela maioria - ou se tornam figuras folclóricas bastante conhecidas, desde que não se levem a sério.

As pessoas, quando compartilham o mesmo espaço, tornam-se politicamente pragmáticas e consideravelmente mais gentis umas com as outras, perdendo quase toda a sua agressividade ideológica, assim como a sua eventual ideologia de agressividade.

Não é como no Twitter ou no Facebook, onde você pode xingar os adversários dos outros partidos à vontade sem ter medo de encontrá-los quando, logo ao sair de casa, botar um pé na rua.

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27.4.20

O automóvel é a mensagem


A cultura se move, os símbolos se deslocam e adquirem novas nuances no Brasil pós-pandemia.

Eventos em drive-ins, exames em drive-thrus, carreatas, e não mais passeatas: o automóvel, agora uma célula de sobrevivência, avança um pouco mais para o centro da nossa civilização; resiste como estandarte, e não só como instrumento, na batalha da cultura contra a natureza - e como símbolo do privilégio de classe.

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11.1.20

O conceito de cultura em Foucault



"[...] se pode falar de cultura, parece-me, sob certas condições. Primeiramente, quando dispomos de um conjunto de valores que têm entre si um mínimo de coordenação, de subordinação, de hierarquia. Pode-se falar de cultura quando atendida uma segunda condição, a saber, que estes valores sejam dados como sendo ao mesmo tempo universais, mas não acessíveis a qualquer um. Terceira condição para que se possa falar de cultura: a fim de que os indivíduos atinjam estes valores, são necessárias certas condutas, precisas e regradas. Mais que isto, são necessários esforços e sacrifícios. Afinal, é necessário mesmo poder consagrar a vida inteira a estes valores para ter acesso a eles. Por fim, a quarta condição para que se possa falar de cultura, é que o acesso a estes valores seja condicionado por procedimentos e técnicas mais ou menos regrados, que tenham sido elaborados, validados, transmitidos, ensinados, e estejam também associados a todo um conjunto de noções, conceitos, teorias, etc., enfim, a todo um campo de saber."

FOUCAULT, Michel. A Hermenêutica do Sujeito. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 220-221.

Leia também: O que é cultura

10.11.18

A publicidade engajada tem futuro?

Héber Sales


Nos últimos anos, vimos cada vez mais campanhas publicitárias com pautas identitárias e valorização da diversidade.

As grandes disputas midiáticas, no entanto, estão terminando com um placar diferente. Tanto nos EUA como no Brasil, as vitórias de Trump e de Bolsonaro sugerem que a maioria anda sentindo falta daquelas grandes narrativas que fazem as pessoas se sentirem parte de algo maior e mais forte do que elas.

Por lá, deu "Make America great again". Por aqui, "Deus acima de todos, o Brasil acima de tudo".

E na publicidade, vai dar o que?

Não ofereço respostas por enquanto, mas duas ressalvas.

A primeira: é preciso observar que, de um modo geral, publicitários costumam ser pessoas mais libertárias, que se identificam naturalmente com as forças centrífugas que geram a diversidade cultural.

Talvez seja difícil para eles captarem o sentido mais profundo do discurso totalizante e autoritário pelo qual a massa se apaixonou.

A segunda ressalva: essa massa não é uma massa tão massiva assim - ela não corresponde a uma maioria sólida. Nos EUA, o placar foi apertado. Por aqui, menor do que os bolsonaristas esperavam.

Lá, dois anos depois, a direita acaba de perder a maioria na Câmara, com um notável avanço não só dos democratas, como também dos socialistas democratas e de candidatos de minorias que jamais tiveram assento no parlamento.

Em que pese o equilíbrio entre conservadores e progressistas, porém, muitas marcas de massa podem estar descobrindo agora que a sua publicidade engajada não tem tanto apelo assim para a outra metade do mercado.


Leia também: Revolução e continuidade na publicidade contemporânea.

7.7.18

O futuro da publicidade e das agências

Héber Sales


Se existe uma pessoa hoje no Brasil com quem vale a pena conversar sobre o futuro da publicidade e das marcas, essa pessoa é a Gal Barradas. Sempre termino nossos papos com a cabeça a mil, cheia de ideias novas. Foi por isso que decidi gravar essa entrevista com ela para o canal do meu grupo de pesquisa. Aproveitem ;)