[trecho de livro a publicar]
Vamos analisar melhor uma variedade muito sutil de miopia de branding. Normalmente ela esconde-se por trás de uma expressão que sensibiliza muita gente: branding emocional. O modelo propõe comunicar as associações de marca por meio de apelos emocionais, destinados a enfatizar a personalidade da marca e construir uma conexão íntima com os consumidores.
Seu ponto cego refere-se a uma omissão recorrente entre os especialistas no assunto: muitas vezes, eles referem-se, de passagem, à necessária ligação com a cultura, mas ignoram a natureza de tal relação e, consequentemente, não tiram vantagem dela.
Vamos direto ao ponto. Acontece que, conforme nos lembra Douglas Holt, os consumidores apegam-se mais àquelas marcas que lhes propõem projetos de identidade capazes de aliviar as tensões existenciais produzidas pelo confronto entre a subjetividade deles e as demandas sociais às quais estão sujeitos em determinado momento histórico - e não por causa de um apelo emocional qualquer.
Complicado? Voltaremos ao assunto, com calma, no próximo capítulo para explicar em linguagem mais coloquial essa tese. Por enquanto, basta lembrar que eventos semelhantes podem provocar emoções muito diferentes em épocas e lugares distantes. A respeito disso, o antropólogo Clifford Geertz não titubeia: "as emoções são artefatos culturais, [pois] sem o guia das imagens exteriorizadas, dos sentimentos falados no ritual, os mitos e a arte, não saberíamos, de fato, como sentir".
De fato, emoção e cultura funcionam de forma muito semelhante e isso tem a ver com o que os psicólogos empíricos chamam de "modo experiencial de conhecimento".
Ao contrário do que ocorre no sistema cogitativo, quando usamos intensamento o raciocínio analítico e deliberado, no "modo experiencial", o pensamento ocorre sem esforço, de forma automática, veloz e não consciente. Assim como ocorre à cultura, ele é um conhecimento tácito que nos liberta de precisar avaliar a cada instante o que convém ou não à circunstância. Seu trabalho, que normalmente chamamos de "intuição", é paralelo e opaco, e sua rapidez resulta da produção de atalhos mentais - denominados heurística -, os quais são acionados pelas emoções em um processo mais ou menos semelhante ao que ocorre quando clicamos sobre ícones numa tela de computador - as emoções funcionam como gatilhos para nos forçar a uma ação rápida e decidida.
Como tais atalhos conectam-se às emoções, eis o x da questão que nos remete à dimensão cultural dos acontecimentos que nos comovem. Porque, como já comentamos, um mesmo evento pode ou não acionar determinada emoção. Depende da cultura! Em certas sociedades, a carne de cachorro pode dar saliva na boca, enquanto, em outras, a ideia pode fazer o sujeito vomitar. Para os homens de uma comunidade, a discussão sobre os aromas e sabores de uma certa seleção de cafés é uma "frescura", enquanto para homens de outro meio é um sinal de "bom gosto" e de capacidade intelectual superior.
Conforme nos lembra Geertz, é tudo uma questão de valores construídos e compartilhados em uma determinada sociedade, percebem?
Leia também: O desafio do branding viral é ser mais cultural.
17.9.12
16.9.12
Razões para trocar a MTV pelo Youtube
Às vésperas de mais um VMB, a MTV cambaleia no Brasil. A Folha de hoje traz matérias sobre a crise e lista motivos para a internet estar tomando a lugar da music television.
Aqui vai um resumo, ponto a ponto, muito útil para quem trabalha não apenas com música mas com branded content e mídias sociais também.
Reações à este post nas redes sociais
No Google+, Johnny Cantarelli, sempre muito perspicaz, comentou: "Vídeo clips são conteúdos para serem vistos tipicamente on demand. Por melhor que seja o pacote de programação, quem quer sintonizar a MTV e ficar esperando os seus artistas e músicas favoritos aparecerem por lá?"
De fato, não faz sentido. Pelo que ando lendo, a estratégia da MTV agora é se posicionar como curadora do Youtube e de toda a música que rola na internet. Vamos ver se conseguem competir com os curadores nativos do mundo digital, incluindo aí a filtragem social, já feita pelo próprio Youtube.
A Camila Carvalho fez uma ressalva muito pertinente também: "Concordo com vocês, mas devo alertar que, apesar do nome, a música deixou de ser o ponto alto do canal. Pelo menos a MTV Brasil tem apostado muito em comédia (e das boas, nada ao estilo CQC ou Zorra Total). Além disso, ela disponibiliza seus programas na íntegra (e com boa qualidade) no próprio site. É claro que ela já não tem a mesma força de antes por ser bastante segmentada e o seu target mudar de comportamento num piscar de olhos, mas ela (ainda) é a única opção de entretenimento aos jovens na televisão aberta."
Leia também: A nova comunicação de massa.
Aqui vai um resumo, ponto a ponto, muito útil para quem trabalha não apenas com música mas com branded content e mídias sociais também.
- "É na internet que o público vai buscar música -pesquisando, fazendo downloads etc."
- "A televisão não tem recurso [viral]. Você não pode compartilhar sua TV".
- Por outro lado, "aparecer na TV pode ajudar muito no desempenho do clipe na internet. Existe uma reação em cadeia. O vídeo chama atenção na internet, a televisão repercute e leva o público à rede".
- "Na rede, o filme pode ser visto para além das fronteiras do país e acaba, por vezes, trilhando carreira internacional."
- "Com a internet veio a segmentação. Todas as grandes mídias perderam força para as mídias sociais. Foi o início de uma cultura em que as pessoas passaram a ser também influenciadas por seus contatos do Facebook e por blogs. A MTV não é mais a primeira a falar aos jovens. Perdeu sua força."
- "No YouTube, o artista consegue monitorar o desempenho junto aos fãs."
Reações à este post nas redes sociais
No Google+, Johnny Cantarelli, sempre muito perspicaz, comentou: "Vídeo clips são conteúdos para serem vistos tipicamente on demand. Por melhor que seja o pacote de programação, quem quer sintonizar a MTV e ficar esperando os seus artistas e músicas favoritos aparecerem por lá?"
De fato, não faz sentido. Pelo que ando lendo, a estratégia da MTV agora é se posicionar como curadora do Youtube e de toda a música que rola na internet. Vamos ver se conseguem competir com os curadores nativos do mundo digital, incluindo aí a filtragem social, já feita pelo próprio Youtube.
A Camila Carvalho fez uma ressalva muito pertinente também: "Concordo com vocês, mas devo alertar que, apesar do nome, a música deixou de ser o ponto alto do canal. Pelo menos a MTV Brasil tem apostado muito em comédia (e das boas, nada ao estilo CQC ou Zorra Total). Além disso, ela disponibiliza seus programas na íntegra (e com boa qualidade) no próprio site. É claro que ela já não tem a mesma força de antes por ser bastante segmentada e o seu target mudar de comportamento num piscar de olhos, mas ela (ainda) é a única opção de entretenimento aos jovens na televisão aberta."
Leia também: A nova comunicação de massa.
12.9.12
A era hipercultural
[Trecho de livro a publicar]
A internet nos lançou de vez em uma era hipercultural. Agora, graças a concretude do virtual, até os mais céticos podem enxergar o que Weber já apontava há mais de um século: o ser humano é um animal que vive suspenso na teia de significados que ele mesmo teceu para si - mal põe os pés no real. A prova está ali, na rede formada por nossos perfis, falas e rastros digitais. Uma rede que só aumenta, em ritmo de hiperinflação simbólica.
Leia também: A realidade aumentada e a Matrix.
A internet nos lançou de vez em uma era hipercultural. Agora, graças a concretude do virtual, até os mais céticos podem enxergar o que Weber já apontava há mais de um século: o ser humano é um animal que vive suspenso na teia de significados que ele mesmo teceu para si - mal põe os pés no real. A prova está ali, na rede formada por nossos perfis, falas e rastros digitais. Uma rede que só aumenta, em ritmo de hiperinflação simbólica.
Leia também: A realidade aumentada e a Matrix.
11.9.12
A importância do branding no e-commerce
A abundância de informações e a explosão de ofertas na internet cria um problema sério para o consumidor: como escolher a melhor opção sem perder muito tempo e com segurança?
Na dúvida, a maioria recorre às marcas mais conhecidas. Poupa-se tempo e se reduz a ansiedade a respeito de ter feito ou não a compra certa.
A importância do reconhecimento de marca já foi afirmada por várias pesquisas sobre branding há muito tempo. Acabo de ver mais uma, desta vez relacionada ao e-commerce latino-americano.
De acordo com o Estudo sobre E-commerce na América Latina em 2012, da comScore, "quase 7 entre 10 consumidores navegam diretamente no site de e-commerce, ressaltando a importância do reconhecimento da marca e lealdade aos vendedores da região".
Outro dado curioso: "[os brasileiros] tem uma maior tendência por começar suas compras através de sites comparadores de preços e anúncios online".
E quem se destaca nos sites comparadores de preços? As marcas mais reconhecidas provavelmente, pois, a menos que a diferença de preço seja muito significativa, o indivíduo não quer perder tempo nem correr o risco de fazer uma má compra.
Leia também: O signo publicitário na era digital.
Na dúvida, a maioria recorre às marcas mais conhecidas. Poupa-se tempo e se reduz a ansiedade a respeito de ter feito ou não a compra certa.
A importância do reconhecimento de marca já foi afirmada por várias pesquisas sobre branding há muito tempo. Acabo de ver mais uma, desta vez relacionada ao e-commerce latino-americano.
De acordo com o Estudo sobre E-commerce na América Latina em 2012, da comScore, "quase 7 entre 10 consumidores navegam diretamente no site de e-commerce, ressaltando a importância do reconhecimento da marca e lealdade aos vendedores da região".
Outro dado curioso: "[os brasileiros] tem uma maior tendência por começar suas compras através de sites comparadores de preços e anúncios online".
E quem se destaca nos sites comparadores de preços? As marcas mais reconhecidas provavelmente, pois, a menos que a diferença de preço seja muito significativa, o indivíduo não quer perder tempo nem correr o risco de fazer uma má compra.
Leia também: O signo publicitário na era digital.
9.9.12
Mainstream à brasileira
"Se formos ver o que toca nas rádios, quais são os discos que essas pessoas compram nas lojas, não será Tom Jobim nem Villa-Lobos" - Mariozinho Rocha, diretor musical de Lado a Lado, justificando a influência da nova classe C nas trilhas sonoras da Globo.Vem aí mais uma novela com a cara da nova classe média brasileira. Para a Rede Globo, nada mais estratégico. O que seduz a audiência de massa agora é se ver e se ouvir na TV.
Antigamente, a atração era assistir à festa dos outros: os excluídos da cultura de consumo maravilhavam-se com o fausto da elite.
Hoje em dia, a coisa está mudada. A nova classe C anda muito ocupada com a sua própria ascensão para perder tempo acompanhando os dramas do andar de cima.
Até porque o que mais lhe diverte sempre existiu na sua comunidade. O que faltava era dinheiro para botar mais feijão no caldo e acessar o tecnobrega pelo Youtube.
Leia também: A orkutização da cultura e do branding.
27.8.12
Mapeando o Cenário de Caos
Eis um resumidíssimo mapa mental da tese de Bob Garfiel, no livro Cenários de Caos, sobre o colapso da mídia tradicional e a ascensão do micromarketing.
Algumas das suas conclusões são questionáveis, especialmente a ideia de que, no novo ambiente, as marcas perderão a sua função básica, mas, com algumas exceções típicas do cenário brasileiro, muitas das tendências descritas por ele já estão acontecendo.
Para melhor leitura do mapa, maximizem o slide.
Algumas das suas conclusões são questionáveis, especialmente a ideia de que, no novo ambiente, as marcas perderão a sua função básica, mas, com algumas exceções típicas do cenário brasileiro, muitas das tendências descritas por ele já estão acontecendo.
Para melhor leitura do mapa, maximizem o slide.
25.8.12
As lições de branding da Gina Indelicada
Você deseja ser um publicitário de sucesso na era digital? Ricck Lopes, criador da Gina Indelicada, deu uma entrevista na qual ensinou o essencial na minha opinião. Veja como ele atua:
- É um pesquisador incansável: "Faço testes nela para saber quais formatos funcionam".
- Dedica-se ao diálogo e à criatividade social: "Eu senti que o pessoal queria participar, fazer perguntas para a Dona Marlene, fazer parte do conteúdo. Aí veio a segunda grande sacada. Em todas as fan pages, as pessoas participam quando o post já está pronto, mas não participam de fato do conteúdo".
- Sabe muito bem que as histórias mais arrebatadoras falam de mitos de identidade e de estilos de vida contemporâneos: "As pessoas se identificaram com a personalidade por ela ser verdadeira e sincera." Sim, dominada pela lógica das mídias sociais, a internet é o império do branding cultural.
- É movido pela verdadeira vocação de um publicitário: "Quando descobri que queria ser publicitário, é porque gosto de lançar um assunto e fazer as pessoas falarem dele".
23.8.12
De volta ao futuro do branding
Por aqui, a história é outra. Enquanto os gringos, atordoados pela crise, decretam uma dieta no consumo e dizem que o excesso está fora de moda, no Brasil, a expansão da classe média junta a fome com a vontade de comer.
Nos dois casos, no entanto, as marcas enfrentam um desafio semelhante: ajudar as pessoas a se livrarem da confusão criada pela poluição midiática e pelo excesso de ofertas pouco diferenciadas.
Por isso, agora só se fala em relevância. Basta dar uma olhada em alguns dos últimos lançamentos sobre branding:
Todos eles retomam lições clássicas que ainda não foram suficientemente assimiladas, sobretudo a necessidade de ter foco e de criar categorias realmente novas ao invés de apenas competir para ser o melhor em uma categoria já existente.
O que me lembra três excelentes dicas de Al Ries e Jack Trout, autores daquele que talvez seja o conceito mais badalado e mal aplicado do branding: Posicionamento.
As dicas são:
Em branding, para criar valor semiótico de marca é preciso exagerar em um contraste relevante e se apegar à ele, caso contrário sua marca será do tipo "mais do mesmo" e não significará nada. E, nessa era de excessos de informação e de ofertas, quem quer "mais do mesmo", não é?
Nos dois casos, no entanto, as marcas enfrentam um desafio semelhante: ajudar as pessoas a se livrarem da confusão criada pela poluição midiática e pelo excesso de ofertas pouco diferenciadas.
Por isso, agora só se fala em relevância. Basta dar uma olhada em alguns dos últimos lançamentos sobre branding:
- Relevância de marca - como deixar seus concorrentes para trás, de David Aaker;
- Reposicionamento - marketing para a era de competição, mudança e crise, de Jack Trout e Steve Rivkin;
- Diferente - quando a exceção vira a regra, de Youngme Moon (para quem não conhece, ela é professora da Harvard Business School).
Todos eles retomam lições clássicas que ainda não foram suficientemente assimiladas, sobretudo a necessidade de ter foco e de criar categorias realmente novas ao invés de apenas competir para ser o melhor em uma categoria já existente.
O que me lembra três excelentes dicas de Al Ries e Jack Trout, autores daquele que talvez seja o conceito mais badalado e mal aplicado do branding: Posicionamento.
As dicas são:
- "É melhor ser o primeiro do que ser o melhor";
- "Se você não é o primeiro, invente uma categoria onde possa dizer que é o primeiro";
- "Desafie o líder com uma ideia oposta, explorando uma fraqueza inerente à sua força".
Em branding, para criar valor semiótico de marca é preciso exagerar em um contraste relevante e se apegar à ele, caso contrário sua marca será do tipo "mais do mesmo" e não significará nada. E, nessa era de excessos de informação e de ofertas, quem quer "mais do mesmo", não é?
14.8.12
Branding segundo Michelangelo
"Valor de marca" e branding são descobertas mais antigas do que muitos supõem.
Já no século XVI, Michelangelo e alguns outros artistas retomavam a tradição de assinar seus trabalhos com a intenção de influenciar a avaliação comercial das obras. A prática era bem comum na Antiguidade Clássica, mas havia desaparecido durante a Idade Média.
O mestre italiano percebeu que a reputação acumulada por ele poderia ser transferida e associada a qualquer novo objeto pela mera colocação de sua "marca".
Por sua vez, tal reputação consolidava-se na medida em que a sua "marca" e o seu estilo iam se repetindo, sempre associados um ao outro, em vários trabalhos ao longo do tempo.
Foi assim que, a partir de um certo momento, a sua assinatura começou a representar um determinado conjunto de características e valores que o distinguiam de outros artistas.
A esperteza de Michelangelo consistiu, portanto, em reconhecer que a marca opera como um tertium mediationis, produzindo um efeito de "arrastamento de valores": "sua principal função é a de transferência de valores, [...] de 'acumulador', de 'frigorífico' destes mesmos valores, o que lhes permitem concentrarem-se no tempo" (VOLLI, 2000, p. 130).
A escala exagerada do mecanismo. No século XXI, a nova comunicação de massa daria muito mais notoriedade à marca "Michelangelo".
Em 2012, ele poderia estar produzindo um tremendo "arrastamento de valores" ao incluir em seu portfólio outras obras de muito maior alcance, todas elas com a "cara" da sua marca: um vídeo viral, uma fan page popular, histórias patrocinadas no Facebook, imagens no Pinterest, fotos no Instagram, ou mesmo um anúncio muito criativo para TV ou cinema, etc.
O nome "Michelangelo" nos pareceria então mais familiar, seu "universo artístico" seria conhecido por muito mais gente. De tanto ver as suas obras midiáticas, saberíamos muito bem que estilo esperar de um novo quadro seu (ou até mesmo de uma griffe de moda que ele resolvesse lançar).
Eis aí um elemento fundamental da marca como autor virtual: a notoriedade obtida por meio da mera comunicação. Se já conheço o "autor" de um produto em virtude das mensagens que sempre recebo dele, mais facilmente poderei confiar nele. Simples assim.
Referências:
VOLLI, Ugo. Semiótica da Publicidade. Lisboa: Edições 70, 2000.
Já no século XVI, Michelangelo e alguns outros artistas retomavam a tradição de assinar seus trabalhos com a intenção de influenciar a avaliação comercial das obras. A prática era bem comum na Antiguidade Clássica, mas havia desaparecido durante a Idade Média.
O mestre italiano percebeu que a reputação acumulada por ele poderia ser transferida e associada a qualquer novo objeto pela mera colocação de sua "marca".
Por sua vez, tal reputação consolidava-se na medida em que a sua "marca" e o seu estilo iam se repetindo, sempre associados um ao outro, em vários trabalhos ao longo do tempo.
Foi assim que, a partir de um certo momento, a sua assinatura começou a representar um determinado conjunto de características e valores que o distinguiam de outros artistas.
A esperteza de Michelangelo consistiu, portanto, em reconhecer que a marca opera como um tertium mediationis, produzindo um efeito de "arrastamento de valores": "sua principal função é a de transferência de valores, [...] de 'acumulador', de 'frigorífico' destes mesmos valores, o que lhes permitem concentrarem-se no tempo" (VOLLI, 2000, p. 130).
De volta para o futuro do branding
Se essa manobra crucial do branding já era conhecida no século XVI, o que há de novo hoje?A escala exagerada do mecanismo. No século XXI, a nova comunicação de massa daria muito mais notoriedade à marca "Michelangelo".
Em 2012, ele poderia estar produzindo um tremendo "arrastamento de valores" ao incluir em seu portfólio outras obras de muito maior alcance, todas elas com a "cara" da sua marca: um vídeo viral, uma fan page popular, histórias patrocinadas no Facebook, imagens no Pinterest, fotos no Instagram, ou mesmo um anúncio muito criativo para TV ou cinema, etc.
O nome "Michelangelo" nos pareceria então mais familiar, seu "universo artístico" seria conhecido por muito mais gente. De tanto ver as suas obras midiáticas, saberíamos muito bem que estilo esperar de um novo quadro seu (ou até mesmo de uma griffe de moda que ele resolvesse lançar).
Eis aí um elemento fundamental da marca como autor virtual: a notoriedade obtida por meio da mera comunicação. Se já conheço o "autor" de um produto em virtude das mensagens que sempre recebo dele, mais facilmente poderei confiar nele. Simples assim.
Referências:
VOLLI, Ugo. Semiótica da Publicidade. Lisboa: Edições 70, 2000.
15.7.12
A orkutização da cultura e do branding
Não só o Facebook está se orkutizando, mas a cultura e o branding também. Antes de me acusarem de elitismo, esclareço logo que não faço aqui juízo de valor ou de gosto. Orkutizar pode ser uma ótima estratégia para algumas marcas. Para outras, não.
A opção depende muito do projeto de marca e da sua estratégia competitiva, que devem ser sempre específicas, adequadas à autoridade cultural da marca, suas competências distintivas, expectativas e aspirações dos seus públicos, posicionamento dos concorrentes e forças competitivas em seu setor.
Notemos, por exemplo, que o sucesso do Orkut antecede à reviravolta no foco das novelas globais e, muito antes de ser sucesso nas trilhas de tais novelas, o tecnobrega beneficiava-se da tecnologia digital em pelo menos duas frentes: os custos de gravação caíram drasticamente e a internet eliminou os atravessadores do ramo - intermediários, entre artistas e consumidores, que controlavam os onerosos meios de distribuição analógicos ou semi-analógicos.
Os consumidores, do mesmo modo, tem agora mais meios para impor o seu gosto, os quais muitas vezes não coincidem com o alto valor que as elites atribuem aos seus eleitos. O "Cala a boca Galvão" é um exemplo bem conhecido da revolta da audiência. O tecnobrega de Gaby Amarantos também, assim como o pop cult de Mallu Magalhães, ambas hoje queridinhas da grande mídia pelo sucesso que alcançaram, quase por conta própria, no MySpace e no Youtube.
Nas timelines do Twitter e do Facebook, além de arte popular e alternativa, vê-se muito entretenimento produzido pelos usuários no estilo meme, termo que se tornou um jargão nerd para o humor viral da internet.
No Brasil, tal humor parece mais irreverente, extravagante e gozador, apelando muitas vezes para o que as pessoas de "bom gosto" achariam grotesco e chocante.
Um tipo de choque, aliás, celebrado por muitos intelectuais, minorias e herdeiros da contra-cultura, para quem o discurso mainstream da moral, dos bons costumes e da boa arte reflete, em última análise, a ideologia da elite, que é anti-democrática e está a serviço da dominação econômica de muitos por poucos.
O artifício costuma garantir mais engajamento com o conteúdo e, consequentemente, maior alcance e audiência, o que favorece aquela métrica que é talvez a mais badalada no branding: consciência de marca.
É preciso pensar, no entanto, em outras variáveis se o propósito disso tudo for aumentar o valor de marca:
Devido ao caráter tribalista da nossa vida social, é importante avaliar também uma questão que às vezes, na busca cega por um viral, se ignora: a reação da maioria silenciosa, gente que não curtiu ou compartilhou o seu meme.
Em resumo, ser muito falada e conhecida pode ser bom para uma marca se o buzz for positivo, mas bom mesmo é se tal buzz também construir associações de marca que tornam a marca mais atraente e desejada no mercado-alvo.
Leia também: A nova classe média e o branding hipercultural.
A opção depende muito do projeto de marca e da sua estratégia competitiva, que devem ser sempre específicas, adequadas à autoridade cultural da marca, suas competências distintivas, expectativas e aspirações dos seus públicos, posicionamento dos concorrentes e forças competitivas em seu setor.
A orkutização da cultura
De certo modo, toda a nossa cultura está se orkutizando, até mesmo o horário nobre da TV. Alguns relacionam o fenômeno à importância da nova classe média. Eu não tenho dúvida, mas gostaria de enfatizar a força da internet nessa virada cultural.Notemos, por exemplo, que o sucesso do Orkut antecede à reviravolta no foco das novelas globais e, muito antes de ser sucesso nas trilhas de tais novelas, o tecnobrega beneficiava-se da tecnologia digital em pelo menos duas frentes: os custos de gravação caíram drasticamente e a internet eliminou os atravessadores do ramo - intermediários, entre artistas e consumidores, que controlavam os onerosos meios de distribuição analógicos ou semi-analógicos.
A mídia da resistência e da diversidade
A internet amplia o espaço público na medida em que, por reduzir os custos de acesso à mídia, permite a qualquer um tentar seus 15 minutos de fama sem precisar ser apadrinhado pelos grandes produtores culturais. Ao contrário, são estes que agora correm atrás das celebridades virais.Os consumidores, do mesmo modo, tem agora mais meios para impor o seu gosto, os quais muitas vezes não coincidem com o alto valor que as elites atribuem aos seus eleitos. O "Cala a boca Galvão" é um exemplo bem conhecido da revolta da audiência. O tecnobrega de Gaby Amarantos também, assim como o pop cult de Mallu Magalhães, ambas hoje queridinhas da grande mídia pelo sucesso que alcançaram, quase por conta própria, no MySpace e no Youtube.
Nas timelines do Twitter e do Facebook, além de arte popular e alternativa, vê-se muito entretenimento produzido pelos usuários no estilo meme, termo que se tornou um jargão nerd para o humor viral da internet.
No Brasil, tal humor parece mais irreverente, extravagante e gozador, apelando muitas vezes para o que as pessoas de "bom gosto" achariam grotesco e chocante.
Um tipo de choque, aliás, celebrado por muitos intelectuais, minorias e herdeiros da contra-cultura, para quem o discurso mainstream da moral, dos bons costumes e da boa arte reflete, em última análise, a ideologia da elite, que é anti-democrática e está a serviço da dominação econômica de muitos por poucos.
A orkutização no branding
Algumas marcas, por ousadia, estratégia bem pensada ou oportunismo, estão surfando a onda dos memes, incorporando-os ao seu conteúdo ou aderindo à sua estética.O artifício costuma garantir mais engajamento com o conteúdo e, consequentemente, maior alcance e audiência, o que favorece aquela métrica que é talvez a mais badalada no branding: consciência de marca.
É preciso pensar, no entanto, em outras variáveis se o propósito disso tudo for aumentar o valor de marca:
- Que tipo de pessoa está se engajando com seu meme?
- O viral decorrente de tal engajamento está atingindo quem?
- É esse o público que você deseja e/ou precisa cativar?
- Como as pessoas passam a enxergar a sua marca depois de ver o meme?
- Em outras palavras, quais significados passam a atribuir à sua marca em função do meme?
- São essas as associações de marca que vão conquistar e fidelizar o seu público-alvo?
Devido ao caráter tribalista da nossa vida social, é importante avaliar também uma questão que às vezes, na busca cega por um viral, se ignora: a reação da maioria silenciosa, gente que não curtiu ou compartilhou o seu meme.
- Por que essas pessoas se calaram?
- Não viram o meme?
- Não gostaram dele?
- Gostaram, mas não souberam como participar ou não tiveram tempo para tanto?
- Ou elas são de "outra turma" e não quiseram nessa "roda de gente estranha"?
- E quem não gostou, por acaso está falando mal do meme por aí?
- É muita gente falando mal?
- Que gente é essa?
- É seu público?
- É influente junto ao seu público?
Em resumo, ser muito falada e conhecida pode ser bom para uma marca se o buzz for positivo, mas bom mesmo é se tal buzz também construir associações de marca que tornam a marca mais atraente e desejada no mercado-alvo.
Leia também: A nova classe média e o branding hipercultural.
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