10.11.12

O meme e o branding hipercultural

O meme foi o grande vencedor da eleição presidencial norte-americana. A análise é de Nathan Jungerson no excelente artigo Speaking in Memes. Alguns dos seus argumentos nos ajudam a entender melhor o papel dessas histórias virais no branding hipercultural.


O que é um meme

Em sua formulação original, o meme é definido como uma unidade cultural de natureza análoga à do gene. Hoje em dia também usamos o termo para identificar conteúdos e significados que são transmitidos de uma pessoa a outra até contaminar todo um corpo social. Veremos alguns exemplos ao longo deste post.


O meme como resistência

Na campanha presidencial norte-americana, nenhum marketeiro político conseguiu fabricar um meme intencionalmente. Para Jungerson, a explicação para isso é simples: os eleitores usam os memes para criticar e resistir ao discurso arrumadinho e pouco autêntico dos candidatos. Sua matéria-prima são as contradições e gafes presentes nas mensagens oficiais.

A foto abaixo, o maior ato falho da história dos EUA segundo o Kulture Kritic, é um bom exemplo do fenômeno. Até este momento, a imagem já foi compartilhada mais de 100.000 vezes por usuários do Facebook.

Família Romney comete ato falho e vira meme na internet.

O grande engajamento dos eleitores nessas brincadeiras e trolagens pode ser visto como uma crítica ao marketing de cima-para-baixo, processo de comunicação em que poucos de nós, receptores, temos alguma influência significativa.

Identificar um ato falho ou compartilhá-lo é para o cidadão uma forma de protestar contra campanhas que pretendem seduzi-lo com mensagens fabricadas demais, que ignoram o lado sujo, manipulador ou ridículo da política e fazem pouco caso do poder de escolha dos indivíduos.

Não é difícil imaginar a lição para outros tipos de marca: as mídias sociais podem se tornar poderosos espaços de resistência caso se ignore a opinião dos indivíduos e o seu desejo de terem voz ativa no processo. Elas são o espaço onde acontece o choque entre o marketing de cima-para-baixo e a comunicação de baixo-para-cima.


O meme como expressão de identidade

O meme pode ser visto como um ato de rejeição ao consumo passivo de campanhas e notícias massificadas. Ele não apenas promove uma contra-leitura das histórias oficiais como também, graças à sua espontaneidade, proporcionam uma experiência de autenticidade.

O ritual propõe um outro modelo de sociedade, no qual possa haver mais agência, mais personalização, mais escolha individual. Nesse sentido, os memes falam mais das pessoas que o compartilham do que de qualquer outra coisa: eles são declarações sobre nós mesmos, servem ao propósito de construir e manter as nossas próprias identidades.


O meme e o culto ao amador

O status de "coisa genuína" do meme é afirmado também pela estética do amador, um detalhe que escapou a Jungerson em seu artigo.

Curtir, comentar e compartilhar uma imagem ou desenho tosco e engraçado, produzido por gente como e a gente, é mais uma forma de contestar uma indústria cultural que ignora a criatividade dos receptores e dá pouco espaço para a afirmação pessoal de sua identidade.

O estilo é bem conhecido dos usuários do Facebook que espalham conteúdo criativo como o Não sou touchscreen. É uma boa piada, mas a sua graça tem muito a ver com o fato de que a peça poderia ter sido feito por uma pessoa qualquer.

"Não sou touchscreen" exemplifica a linguagem meme.


A estética do amador no branding

Algumas empresas veem nesse movimento uma oportunidade e se juntam a ele na expectativa de ampliar o alcance viral do seu conteúdo. A estratégia funciona também para comunicar que as marcas são "gente como a gente" e, com isso, ganhar a simpatia do público.

Esta peça do Sadia Hot Pocket, veiculada no Facebook, dificilmente seria publicada na mídia impressa, meio em que a linguagem estética (ainda?) é mais refinada e procura sinalizar um "trabalho de profissional", abordagem bastante coerente com imagem de alta performance que as marcas da era industrial cultivam.

Peça sobre o Sadia Hot Pocket usa linguagem meme.

Outro caso típico é o da imagem criada para divulgar o Amigo Secreto Solidário do Salvador Shopping. O estilo elegante da marca está presente na execução da peça, o que afirma um atributo fundamental de sua identidade, mas o discurso segue o padrão meme discutido acima.

Amigo Secreto Solidário do Salvador Shopping usa linguagem meme.

Na linha da marca que é "gente como a gente", o Spoleto talvez tenha sido o anunciante mais ousado até momento: produziu uma série de vídeos derivados de uma história que satirizava o seu serviço por ser exageradamente fast.

A estratégia está colocando o Spoleto em sintonia com o movimento meme e com o espírito do nosso tempo, tão contrário a tudo que parece suspeitamente certinho e perfeito demais. Por saber rir de si mesma e adotar o ponto de vista do consumidor de forma criativa, a marca tem se dado muito bem - os seus vídeos são um sucesso de audiência na web. Boa lição de branding para as empresas (e para os políticos também).

Leia ainda: A orkutização da cultura e do branding.

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