29.11.12

Espertezas do branding vagaroso

Enquanto o mundo gira cada vez mais veloz, a Delayed Gratification, primeira revista de slow journalism do mundo, pede um pouco mais de paciência e dá uma boa lição de branding. A publicação está construindo uma sólida autoridade cultural de marca com base em quatro princípios.

Delayed Gratification, revista ícone do slow journalism.


Flanqueamento

O primeiro deles é uma estratégia clássica de posicionamento: flanquear as marcas líderes por meio do lançamento de uma nova categoria (slow journalism).

Em um era de information overload, a recomendação de Al Ries e Jack Trout* soa mais atual do que nunca: "é melhor ser o primeiro na mente do consumidor do que ser o melhor". Porque ser ou não ser o melhor é uma questão muito relativa, mas a mente sobrecarregada por dados, não: falta cabeça e tempo para memorizar tudo que pareça "mais do mesmo".

Na dúvida, se a diferença entre dois produtos é apenas de grau e não de categoria, o consumidor opta pelo pioneiro, pela coisa original (quem teria tempo para folhear mais uma revista de slow journalism depois de ler a "genial" Delayed Gratification?).


Franqueza

Admitir um defeito pode ser a melhor forma de se destacar. Não só porque isso nos surpreende e nos lembra imediatamente o ponto forte inerente à fraqueza ("se o jornalismo é mais lento, ele apura melhor os fatos"), mas também porque parece ser mais honesto. E como todos nós já sabemos, ser transparente, até mesmo ao ponto do "nu frontal", tem sido uma das tendências de branding mais críticas do nosso tempo.


Consistência

A primeira impressão é a que fica. O que ela realmente significa, porém, só o tempo vai dizer.

A identidade de uma marca, como qualquer outra ficção útil, adquire densidade na medida em que ganha contexto e é enfatizada pela recorrência de determinados temas, figuras e preferências. Tudo isso demora um bocado, exige acumulação minuciosa e bem sedimentada de muitas partículas semióticas.

É exatamente nesse ponto que o slow journalism e a comunicação de marca se tocam: branding vagaroso quer dizer que construir uma marca forte exige paciência de Jó, constância de propósitos e muita atenção, pois o que torna o mundo de uma marca mais vívido e convincente é justamente a riqueza de detalhes com que ela, a marca, narra as suas histórias (no branding hipercultural, tais histórias giram em torno de mitos de identidade)


O tao da cultura

O mito de identidade da Delayed Gratification está profundamente enraizado em um movimento cultural cada vez mais popular, que promove ideias como as do slow food, do cittaslow, do slow living, etc.

A revista é forte candidata a ícone cultural de uma sociedade que começa a encarar como privilégio o poder se desconectar do feed nervoso de informações e "curtir a vida lá fora" sem a preocupação de que está perdendo alguma coisa.

Há algumas décadas, assistimos a um fenômeno parecido quando surgiu o movimento verde e a onda de reconexão com a natureza: o apogeu da urbanização despertou em nós um desejo mais forte pelo seu oposto, a vida rural. Agora, um mundo cada vez mais veloz nos faz lembrar das maravilhas da paciência e da vagarosidade.

Aparentemente, os dois processos resultam de uma lei mais geral: na semiose infinita, assim como no tao te ching, um extremo costuma levar a outro. E vice-versa.


* Al Ries e Jack Trout são autores do clássico Posicionamento - a batalha pela sua mente.

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