Héber Sales
O valor da marca está atrelado ao significado, e o significado é construído por meio de oposições semânticas. Daí falarmos em valor semiótico de marca.
Segundo Jean-Marie Floch (2001), as mensagens publicitárias assim como as identidades das marcas giram em torno de uma distinção elementar: ou elas falam de "valores de base", ou de "valores de uso".
Esses termos são emprestados à teoria da narração: as histórias sempre mostram seus personagens em busca de algo (valor de base); para terem sucesso, eles precisam antes adquirir competências (valores de uso).
O Quadrado de Floch e os quatro tipos de marca
Após analisar inúmeras campanhas e marcas, Floch desdobrou esses pólos semânticos em quatro tipos de discurso valorativos, representando-os por meio de um quadrado semiótico particular, o Quadrado de Floch.
Com base nesse esquema, podemos visualizar quatro categorias de marca:
- Os discursos da marca prática concentram-se naquilo que ela sabe fazer, em valores de uso como por exemplo conforto, segurança, velocidade, resistência, etc.;
- A marca utópica desenvolve um discurso mítico, orientado para valores existenciais que definem estilos de vida e identidades;
- A marca crítica valoriza o aspectos racionais da compra, especialmente o preço e a relação custo/benefício;
- Finalmente, a marca lúdica promove o agrado e o divertimento proporcionados por ela em seus produtos e textos publicitários.
O mapping semiótico dos valores do consumo
Andrea Semprini (1995) reconfigurou o Quadrado de Floch, transformando-o num diagrama cartesiano que oferece espaços mais amplos para o posicionamento da marca. Por meio do "mapping semiótico dos valores de consumo", podemos representar, por exemplo, marcas que combinam traços utópicos e lúdicos como foi o caso da Dove em sua campanha pela real beleza, numa estratégia publicitária analisada por Sandra Depexe e Juliana Petterman (2007).
As marcas posicionadas no quadrante da missão enfatizam em seus discursos o sentido do coletivo e a busca de um futuro melhor para uma comunidade ou grupo de consumidores por meio de respostas inovadoras.
Um posicionamento baseado em projeto exige da marca valorizar o indivíduo, o sonho, a aventura, a mudança e a valorização do abstrato, assim como o corpo.
A euforia é o quadrante ocupado por marcas que situam-se entre o lúdico e o prático. Esse posicionamento é caracterizado pela valorização da subjetividade e da emoção - é o espaço de grupos afetivos como a família e os amigos.
O quadrante da informação é mais voltado para o produto, suas qualidades, funções e desempenho. É dominado pela lógica do essencial, pela valorização do básico e do necessário, ou pela lógica da vantagem em termos de custo/benefício.
Escolhendo a melhor estratégia de marca
Qual dessas estratégias semióticas pode levar uma marca a liderar e dominar seu mercado?
Em primeiro lugar, é preciso ver qual a vocação da marca a partir de uma análise da sua história, da sua autoridade político-cultural e das suas competências. Muitas organizações sofrem de miopia de branding por exemplo, e, para se tornarem marcas utópicas, precisam superar tal limitação.
Depois é necessário levar em conta o posicionamento da concorrência. No caso do quadrante da informação, é muito difícil deslocar um concorrente direto bem estabelecido nele. Geralmente tal organização possui uma vantagem absoluta de custo, além de já ter se fixado na mente do consumidor-alvo como o melhor custo/benefício do setor. O jeito é lançar uma nova categoria como fez a Subway no mercado de fast-food norte-americano ao atacar o MacDonald's explorando a oposição semântica entre comida "natural" e comida "industrial" ou "artificial".
Considerar o horizonte de expectativas do consumidor em relação à
categoria é outro critério importante, assim como saber quando há
vantagens em deslocá-lo. Em nossa cultura, as pessoas esperam geralmente
que um político se situe no quadrante da missão. O humorista Tiririca
contrariou essa expectativa posicionando-se como uma marca lúdica nas
últimas eleições, e ganhou a atenção da mídia e dos eleitores por ser o
inusitado, o fato novo, saliente, do pleito. A estratégia funcionou também porque era coerente com a trajetória do candidato
e explorou a força da marca "Tiririca", muito conhecida e com imagem
bastante apropriada ao discurso adotado na campanha.
Finalmente devemos lembrar que as marcas de maior valor vendem significados e não valores utilitários ou mero desempenho. Os benefícios funcionais que os produtos e serviços dessas marcas proporcionam, assim como a autoridade cultural e política acumulada por elas ao longo de sua história, servem para legitimar projetos de sentido em torno de estilos de vida e de identidades. Eis a proposta do branding hipercultural.
Referências bibliográficas
DEPEXE, Sandra Dalcul e PETTERMAN, Juliana. O raio-x da verdade da marca. VIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação da Região Sul. Passo Fundo: Intercom, 2007.
FLOCH, Jean-Marie. Semiotics, Marketing an Communication: Beneath the Signs, the Strategies. Basingstoke: Palgrave Mcmillan, 2001.
SEMPRINI, Andrea. El marketing de la marca. Una aproximación semiótica. Barcelona: Paidós, 1995.
Muito bem feito e baseado. Obrigada!
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