15.11.09

Umberto Eco e a Cultura

É admirável a capacidade do Umberto Eco para, em poucas palavras, chegar ao cerne da questão: cultura é negação da morte*.  Aconteceu em uma entrevista dele para a Der Spiegel. Traduzo a seguir, livremente, as minhas passagens favoritas.
  • "O que deseja a cultura? Fazer o infinito compreensível, criar ordem - nem sempre, mas frequentemente. E como, enquanto ser humano, alguém encara o infinito? Como ele tenta agarrar o incompreensível? Através de listas, de catálogos, de coleções em museus, e de enciclopédias e dicionários." 
  • "Nós temos um limite, um limite muito desanimador e humilhante: a morte. É por isso que nós gostamos de tudo que pareça infinito, sem limites. É um modo de escapar dos nossos pensamentos sobre a morte. Gostamos de listas porque não queremos morrer."
  • "Nós vivemos fascinados pelo espaço infinito, pelas estrelas sem fim, pelas galáxias além das galáxias. Como uma pessoa se sente quando olha o céu? Ela se sente sem palavras para descrever tanta maravilha. No entanto, as pessoas sempre descreveram o céu, simplesmente listando o que elas vêem. Amantes vivem a mesma situação. Eles experimentam a insuficiência da linguagem, uma falta de palavras para expressar seus sentimentos. Mas os amantes não desistem de tentar, não é? Eles criam listas: seus olhos são maravilhosos, sua boca também, e o seu busto..."
  • "A lista é uma manifestação de uma sociedade muito avançada e sofisticada, porque uma lista permite-nos questionar as definições essenciais. Uma definição essencial é primitiva se comparada com uma lista."
  • "Cultura significa saber como se situar em dois minutos." **
  • "[Mas] se você interage com coisas em sua vida, tudo está em constante mudança. Se você não percebe isso, você é um idiota."
* Dentre os autores que já li, quem escreveu mais profundamente sobre essa ideia foi o antropólogo Ernest Becker, em "A Negação da Morte", um dos meus dois livros de cabeceira.
** Para saber mais, leia minha nota sobre cultura e conhecimento.

16.10.09

A realidade aumentada e a Matrix

A tecnologia da realidade aumentada só tornará mais visível a esfera simbólica em que vivemos quase o tempo todo.

Parafraseando Max Weber, o ser humano é um animal que vive suspenso em teias de significados que ele mesmo teceu - não se relaciona com "as coisas como elas de fato são", mas com "as coisas enquanto representações da mente" (leia mais em mapas mentais).

Nesse processo, os signos mediam a nossa relação com o mundo natural, funcionando como tradutores - dificilmente temos contato direto com a realidade, livre dessa tradução. O nosso habitat é a semiosfera*.

O homem já vive, há milênios, dentro da Matrix, num mundo virtual governado por um software chamado "cultura", devidamente customizado pela nossa experiência pessoal e pelos nossos processos de subjetivação (leia mais cultura e conhecimento).

De certo modo, o que a realidade aumentada fará é apenas tornar esse mundo virtual mais visível.


Nota

* O termo semiosfera foi proposto originalmente por Iuri Lotman.

11.10.09

A certeza impossível

Excelente a coluna do Marcelo Gleiser na FOLHA hoje*, explicando a impossibilidade do conhecimento absoluto no mundo sub-atômico**. Eis seu argumento central:

"no mundo dos átomos e das partículas, medir é interferir: ao observarmos um sistema, mudamos irreversivelmente o seu comportamento.

Juntando isso ao princípio de incerteza***, chegamos ao dilema de Einstein: se prepararmos o mesmo sistema da mesma forma várias vezes, e medirmos a mesma propriedade (por exemplo, a posição do elétron num átomo de hidrogênio a uma certa temperatura), cada medida que fizermos não dará o mesmo resultado. Temos de repeti-la muitas vezes e usar estatística: o elétron tem uma parcela de chance de estar aqui, outra de estar lá etc."
* Assinantes UOL ou FOLHA, podem ler a coluna do Marcelo Gleiser na íntegra.

** Céticos e relativistas vão além e julgam impossível conhecer de modo absoluto a realidade última de qualquer coisa. Para maiores detalhes, acessem as minhas notas sobre Relativismo e Ceticismo aqui mesmo no blog.

*** Segundo o princípio da incerteza, a quantidade de informação que podemos extrair de um sistema qualquer é sempre limitada.

30.7.09

Como a parceria Microsoft & Yahoo afetará o Marketing de Busca?

Finalmente saiu a parceria entre a Microsoft e o Yahoo. Foi o assunto do dia ontem no mercado de buscadores. Espera-se que o novo Bing, buscador da Microsoft, seja bastante fortalecido pelo acordo.

Quais as implicações disso para a prática do Marketing de Busca (SEM - Search Engine Marketing)?

Clique aqui para continuar lendo a minha coluna na Webinsider.

29.7.09

O novo Twitter e o Marketing de Busca

O Twitter estreou homepage que privilegia as buscas. Agora, mesmo quem não é usuário do serviço pode pesquisar seu conteúdo por palavras-chave. O que isso significa para quem trabalha com marketing de busca?

Clique aqui para continuar lendo minha coluna na revista Webinsider.

22.7.09

Dicas práticas de marketing de busca (SEM)

Tenho dados dicas sobre marketing de busca (SEM) diariamente para meus seguidores no Twitter. Confira algumas delas:
  • Como colecionar links e subir no Google? 1) conteúdo relevante 2) cadastre-se em catálogos/diretórios 3) relacione-se: http://migre.me/3Mum.
  • Pq seu concorrente está no topo do Google? Um fator: o concorrente de um cliente tem 597 links apontando pra ele; meu cliente, apenas 6.
  • Quais palavras são + usadas pelo seu público nas buscas? Meu cliente se surpreende ao descobrir q o termo mais usado não consta no site dele.
  • Acabei de analisar um site sem tags de título/sub-título no HTML. Erro primário para quem quer melhorar a visibilidade do site nas buscas.

13.6.09

Não me faça pensar

As evidências acumulam-se. Não gostamos de pensar. Muito raramente planejamos e agimos com plena consciência do que estamos fazendo, com critérios e objetivos claros. E eu nem sei se isso seria proveitoso (como sugerem alguns manuais clássicos de estratégia e tomada de decisão), pois geralmente seguir planos é pedir para ser trouxa.

Pois bem, acabei de ler um livro fantástico sobre usabilidade de web sites. Chama-se Não me Faça Pensar, de Steve Krug. Em seu segundo capítulo, entitulado Como realmente usamos a web, são apresentados três fatos sobre o comportamento dos usuários da rede.
  1. Nós não lemos páginas. Damos uma olhada nelas.
  2. Não fazemos escolhas ideais. Fazemos o que é suficiente.
  3. Não descobrimos como as coisas funcionam. Nós apenas atingimos nosso objetivo.
É uma bela descrição do comportamento não só dos internautas como de qualquer tomador de decisão, seja ele um consumidor, um gestor ou um amante. Aliás, Steve Krug recorre aos famosos estudos de campo de Gary Klein para justificar suas ideias. Reproduzo a seguir alguns dos seus argumentos.
A equipe de observadores de Klein começou seu primeiro estudo (sobre comandantes de bombeiros em situações de incêndio) com o modelo amplamente aceito de tomada racional de decisões: ao se deparar com um problema, uma pessoa coleta informações, identifica as possíveis soluções e escolhe a melhor. Eles iniciaram com a hipótese de que, devido à importância e à extrema pressão de tempo, os comandantes de bombeiros poderiam comparar apenas duas opções, uma suposição que eles achavam que fosse conservadora.

Acabou que os comandantes de bombeiros não comparavam quaisquer opções. Eles pegavam o primeiro plano razoável que vinha à mente e executavam um teste mental para descobrir algum problema nele. Caso não encontrassem algum, já tinham seu plano de ação.
Irracional? De modo algum. Há muitas vantagens em agir assim, sem dar muita bola para um planejamento analítico e formal. Eis algumas delas:
  • Como Klein destaca, "otimizar é difícil e demora muito. fazer o suficiente é mais eficiente."
  • Geralmente não há uma punição grande para suposições erradas.
  • Num mundo confuso e imprevisível, ponderar as opções pode não melhorar as chances.
  • "We won't know the outcome until we explore".
  • Adivinhar é mais divertido, já que aumenta as nossas chances de encontrar algo surpreendente e bom.
Note, tudo isso não quer dizer que nunca ponderamos criteriosamente as opções antes de agir. Quando usamos o modo de pensar cogitativo, nós costumamos ser mais analíticos e críticos. Acontece que raramente nós o usamos. Preferimos nos manter no modo experiencial de pensamento, o que, como vimos acima, não é necessariamente ruim e, em muitas situações, pode até ser mais vantajoso.

Se você quiser ir mais fundo na questão, recomendo a leitura do Safári de Estratégia, livro em que a escola de planejamento formal é analisada (e criticada) à luz das teorias atuais sobre como realmente funciona a mente humana e o aprendizado organizacional.

30.5.09

Um (pre)texto para a imaginação

Marketing e poesia, muitos estranham a mistura. Afinal, o executivo costuma ser caracterizado na nossa cultura por sua racionalidade instrumental. Frio, calculista, pragmático, materialista, o gestor seria o oposto do sensível, emotivo e espiritualizado poeta. Ora, esse senso comum carrega um grande engano.

Para começo de conversa, poesia não é emoção. Envolve emoção também, mas não apenas ela. E nem é a emoção seu principal elemento. A poesia é uma aventura lingüística que expande o pensamento.
"A razão só pode seguir os caminhos que imaginação abriu primeiro. Sem palavras, não há raciocínio. Sem imaginação, não há palavras novas. Sem palavras novas, não há progresso moral ou intelectual.

Culturas com vocabulários mais ricos são mais plenamente humanas – mais distantes das bestas – do que as mais pobres; homens e mulheres individuais são mais completamente humanos quando suas memórias estão amplamente estocadas com versos." (Richard Rorty).
Eu já discuti aqui no blog como a emoção pode ser um fenômeno bem menos subjetivo do que supomos. Não repetirei todos os argumentos agora. Lembro apenas que as nossas emoções só se tornam perceptíveis e significativas para nós graças à sua natureza cultural e simbólica. Isto quer dizer que elas são fortemente institucionalizadas, modeladas por valores e crenças coletivos.

Talvez por isso João Cabral de Melo Neto tenha dito que a poesia é como um pássaro obrigado a caminhar no chão por um quilômetro. Fiel à sua abordagem antilírica, o poeta pernambucano esclarecia com tal frase que a grande poesia é contra-intuitiva.

É preciso desconfiar das nossas "idéias inspiradas", pois, como bem alertou Antonio Cicero numa coluna na Folha de São Paulo, elas geralmente não passam de ecos e simples re-arranjos do que lemos e ouvimos por aí. Para escrever ou dizer algo realmente original e criativo, é preciso combater os ilusionismos da inspiração repentina e os automatismos da língua domesticada.

A poesia funciona assim. Ela extrai a porção fóssil da língua, chacoalha as nossas idéias acostumadas.

"As minhocas arejam a terra, o poeta areja a linguagem", já disse o poeta Manoel de Barros.

O professor e crítico João Adolfo Hansen expressou a proposta brilhantemente:
"[O papel da poesia é] produzir vazio, evidenciando a ficção que é o eu, impedindo que se delire com a linguagem das instituições, dando forma eficaz às maiores dores, fazendo a gente ficar espantado com a alternativa de outra vida".
Como a poesia é capaz de fazer isso? Por meio de boas metáforas (como fez o próprio João Cabral ao comparar a poesia a um pássaro por exemplo): a matéria-prima de um grande poema é a metáfora escrita de uma forma rara e sensível.

Manoel de Barros costuma dizer que em seus poemas a metáfora apaga a idéia, deixando os leitores livres para interpretar os seus versos como quiserem - é preciso muita imaginação para "compreender" a poesia dele, porque nela poucas palavras são usadas de acordo com dicionários. E é aí que a poesia deixa de ser apenas "uma ocasião para a beleza", como queria Jorge Luis Borges, e passa a servir também como um (pre)texto para a imaginação.

Por isso quando você, pessoa de negócios, precisar de um bom motivo empresarial para ler poesia sem vergonha, pode apelar: "leio poemas para desenvolver a minha criatividade e a minha capacidade de inovar blá, blá, blá" - no fundo, porém, nós sabemos que o seu objetivo é bem mais nobre: você lê poesia para se tornar plenamente humano.

Para ir além:

Conhecimento poético
Entrevista com Antonio Cicero

25.2.09

Da Dimensão Social da Arte

Por Héber Sales

Por mais singular que seja a coisa da arte, a cumplicidade (e a tensão) entre indivíduo e sociedade permanece na medida em que o artista, para se expressar, lança mão de estruturas de significados compartilhadas nem que seja por meia dúzia de adeptos desta ou daquela corrente estética, a qual, ao afirmar publicamente a sua presença, acaba situando-se num campo de referências socialmente construído: a herança cultural de uma civilização e a sua tradição artística... [ Continue lendo no Portal Literal].

31.1.09

Se funciona, é o que importa

Belo debate entre parceiros. Nassim Nicholas Taleb e Daniel Kahneman são entrevistados por John Brockman, editor do Edge, e dão um show de inteligência (veja o vídeo aqui).

Me chamou a atenção a fala de Kahneman sobre o uso de modelos. Para ele, nós humanos adotamos esta ou aquela teoria não por sua verdade objetiva, mas pelos seus efeitos práticos. Se funciona, mesmo que temporariamente, é o que nos importa.

A posição de Kahneman é muito semelhante àquela de Paul Feyerabend, a qual citei aqui, e lembra também as teses pragmatistas de Richard Rorty, que, por sua vez, costuma levar a idéia às últimas consequências ao afirmar que toda crença útil é verdadeira (leia aqui um pouco mais a respeito).

29.1.09

Cultura e conhecimento

Na nota anterior, citei o conceito de cultura de modo bastante superficial, sem maiores elaborações. Sugeri apenas que se tratava do conjunto de normas que observamos enquanto interagimos uns com os outros em sociedade. O termo, porém, envolve muitas outras sutilezas. Sua exata definição ainda é bastante disputada. [Continue lendo].

27.1.09

Emoções, cultura e modos de pensar

As nossas emoções não apenas carregam conhecimento como também são importantes elementos num sistema específico de pensamento, o sistema experiencial. O termo foi criado pelos psicólogos Daniel Kahneman e Amos Tversky. Segundo eles, nossas atividades mentais estão ligadas a um modo duplo de pensamento, que inclui dois sistemas: o experiencial e o cogitativo. Nesta nota, discutirei algumas das relações entre esses modos de pensar, as emoções e a cultura. [Leia o texto completo].

20.1.09

O anything goes de Paul Feyerabend e o valor dos mapas mentais

Como de costume, o Roger Oleniski postou outro texto esclarecedor. Desta vez sobre Paul Feyerabend e a ciência como forma de vida. Este trecho, sobre o sentido do anything goes do filósofo austríaco, resume bem a idéia:
"Qualquer teoria, por mais absurda e sem apoio empírico que seja, pode se tornar relevante, pois pode, quem sabe, romper com hábitos metodológicos e mentais e com o engessamento de certas regras de um jogo determinado."
A tese me fez pensar nas teorias como mapas mentais e em como, para Karl Weick, tais mapas são sempre úteis, até mesmo quando estão errados, porque sem eles não haveria aprendizado:
"Com o mapa na mão, não importa o quanto ele seja grosseiro, as pessoas codificam aquilo que vêem para que corresponda o máximo possível ao que está no mapa. Este prefixa as percepções dela, que vêem aquilo que esperam ver. Porém, à medida que se acumulam as discrepâncias, elas prestam mais atenção ao que está em sua experiência imediata, procuram padrões e prestam menos atenção ao mapa. Este torna-se então mais metafórico mas, ironicamente, somente porque foi o meio pelo qual outros mapas, mais atuais, foram formados" (p. 5).
WEICK, K. E. Cartographic Myhs in Organizations.
Em A. S. Huff, ed., Mapping Strategic Thought.
New York: Wiley, 1990: 1-10.

> Leia também: Os limites do conhecimento e como lidar com eles.

17.1.09

Conhecimento e beleza

Nem utilidade nem objetividade. I. F. Stone, autor do soberbo O Julgamento de Sócrates, sugere que a justificação necessária para as nossas crenças mais elementares é o sentimento de beleza que elas nos provocam.
"Creio que a vida do homem se reduz, em última análise, a uma fé - cujos fundamentos estão além de qualquer prova - e que esta fé é uma questão estética, um sentimento de beleza e de harmonia".
O texto é do último número do I. F. Stone's Weekly, uma newsletter bi-mensal escrita pelo jornalista entre 1953 a 1971. A publicação chegou a distribuir 74 mil exemplares numa única edição. Sua assinatura custava 5 dólares. Apesar de impresso, o periódico talvez tenha sido, em sua abordagem e propósitos, o primeiro blog jornalístico realmente independente.

Uma boa descrição da vida e dos métodos de trabalho de I. F. Stone pode ser lida na apresentação que  Sérgio Augusto fez para o livro O Julgamento de Sócrates, impecável peça de jornalismo investigativo a serviço das ciências humanas. A obra foi publicado no Brasil em 2005 pela Companhia das Letras. É imperdível.

* * *

Veja também:

14.1.09

Sobre a dimensão social da arte

A artista visual e poeta Constança Lucas citou hoje em seu blog uma passagem interessantíssima do livro Cartas sobre Cézzane, de Rainer Maria Rilke.

É o tipo de assunto que me inquieta. Não estou tão certo assim a respeito da autonomia do fazer artístico.

A tensão entre o indivíduo e a sociedade permanece na medida em que o artista, para se expressar, lança mão de estruturas de significados compartilhadas, o que quer dizer socialmente construídas (nem que seja por meia dúzia de adeptos desta ou daquela corrente artística).

O drama é ainda maior para quem está na indústria cultural e joga com a audiência, situação em que a liberdade de expressão artística fica sujeita a uma regulação social mais evidente.

Neste caso, é preciso negociar a criatura artística, desde a sua concepção - e geralmente de modo tácito - junto ao público (por exemplo, as pesquisas de opinião sobre desfechos de filmes), aos produtores, aos gatekeepers, aos patrocinadores, aos agentes do governo, etc., o que acaba fazendo da coisa mais uma invenção coletiva do que uma expressão da singularidade do artista.

A propósito, sugiro a leitura do ensaio A arte como um sistema cultural publicado por Clifford Geertz em seu livro O Saber Local. É mais lenha na fogueira.

12.1.09

As emoções como estados mentais de representação

Por mais limitados e especulativos que sejam os nossos mapas mentais, eles são bastante complexos e cheios de sutilezas. Num post anterior, me referi a eles como 'representações da realidade em termos de categorias conceituais'. Mas não é só isso. Nossos mapas mentais também incluem outros estados psicológicos de representação, alguns dos quais envolvem as emoções.

O medo, a raiva, a paixão, etc., são informativos; as emoções carregam conhecimento. O medo de que o motoqueiro ao lado seja um assaltante, por exemplo, é um medo de que o mundo seja de um determinado modo - de um modo tal que haja muitos assaltantes usando motocicletas para abordar motoristas de automóveis.

Ao afirmar que há conhecimento embutido nas emoções, não quero dizer que tal conhecimento seja verdadeiro. Se ele corresponde ou não à realidade objetiva das coisas (isso existe?) é uma outra questão.

Preocupa-me, no entanto, que muitos de nós costumemos ignorar as nossas emoções como possíveis fontes de informação e aprendizado. No mínimo, ao refletir sobre elas, poderíamos eventualmente descobrir que se baseiam em suposições falsas ou muito pouco prováveis.

8.1.09

Quem quer saber se a verdade é verdadeira?

Outro dia escrevi sobre o fundo Madoff para ilustrar a importância da epistemologia para a gestão estratégica. Em tese, os executivos, como a maioria de nós, deveriam estar muito preocupados em tomar decisões baseadas em crenças verdadeiras:

"Por atribuir valor ao reconhecimento de meios eficazes para a realização dos objetivos, a maioria das pessoas se preocupa em apreender a distinção entre o reconhecimento verdadeiro desses meios e o reconhecimento meramente aparente. Em decorrência disso, devemos atribuir valor à epistemologia pelo menos na medida em que ela lança luz sobre a distinção entre o conhecimento verdadeiro (ou o reconhecimento) e o conhecimento aparente" (p. 44).

Moser, Mulder e Trout, em
A Teoria do Conhecimento.

Na prática, entretanto, a tese é bastante problemática: será que as pessoas realmente se preocupam em apreender a diferença entre conhecimento verdadeiro e conhecimento aparente? Ou elas preferem descobrir o conhecimento-que-funciona pelo método da tentativa e erro?

Richard Rorty, após considerar sem proveito as nossas tentativas de definir a verdade objetiva das coisas, sugere, nietzscheanamente, que toda crença útil é verdadeira.

Apesar de não responder como podemos saber se uma crença é REALMENTE útil, a proposta pragmatista me parece empiricamente válida. Percebo que, no dia a dia, raras são as vezes em que as pessoas avaliam exaustivamente se conhecem ou não a verdade objetiva das coisas.

Como sugeri aqui, geralmente tomamos como certas aquelas crenças que parecem funcionar - até que não mais funcionem. É o que propõe também Henry Mintzberg em a sua teoria sobre aprendizado estratégico.

* * *

Nem utilidade nem objetividade. I. F. Stone sugere que a justificação necessária para as nossas crenças mais elementares é o sentimento de beleza que elas nos proporcionam.

6.1.09

Subjetividade e realidade em "Nove Noites"

"É preciso entender que cada um verá coisas que ninguém mais poderá ver. E que nelas residem suas razões. Cada um verá as suas miragens." (p. 42).

CARVALHO, Bernardo. Nove Noites.
São Paulo: Companhia das Letras, 2006.